Lição 2 – A Pessoa do Líder
Prezado(a) professor(a), para ajudá-lo(a) na sua reflexão, e na preparação do seu plano de aula, leia o subsídio da semana. O conteúdo é de autoria do pastor Elias Torralbo, comentarista do trimestre.
INTRODUÇÃO
Não há liderança sem a pessoa do líder. Essa é uma declaração óbvia e pode soar, em certa medida, como ingênua; entretanto, quando o assunto é liderança, duas coisas devem ser destacadas: I) Essa é uma das verdades mais importantes; II) Essa é uma das realidades mais negligenciadas. Por essa razão, este capítulo visa ultrapassar as fronteiras do trabalho que um líder faz e das expectativas existentes em torno disso para refletir sobre a sua constituição pessoal.
Antes de avançar em direção ao objetivo de identificar aspectos da pessoa do líder e como isso pode e deve influenciar a sua vida e o seu trabalho, ressalta-se que o líder deve ter autoconhecimento, ou seja, que ele seja capaz de conhecer a si mesmo, de ser consciente das suas qualidades e de reconhecer os seus defeitos, pois somente assim a sua liderança estará em constante aperfeiçoamento e na direção da excelência. A respeito disso, John W. Stanko mostra a importância e as razões pelas quais o líder deve conhecer a si mesmo.
Dentre as contribuições que Stanko oferece, destaca-se que o líder que conhece a si mesmo é capaz de identificar os seus pontos fracos e os seus pontos fortes, o que lhe dá condições de potencializar as suas qualidades e trabalhar as suas deficiências objetivando o seu aperfeiçoamento. Fica, portanto, registrada a importância de o líder ter como meta uma constante autoavaliação, trabalho que depende de: I) Disposição em realizá-lo; II) Sensibilidade para identificar as necessidades e as possíveis falhas; e III) Coragem para agir no sentido de corrigir o que está errado e propor novas atitudes.
A essa altura, já deve estar claro que, embora a liderança de um determinado líder seja importante e imprescindível, a pessoa deste líder é ainda mais importante. Os registros bíblicos a respeito do trabalho dos muitos líderes que Deus levantou ao longo da história nunca depreciam a individualidade e as suas necessidades; pelo contrário, a Palavra de Deus sempre acentua o valor de cada um deles.
Leia atentamente as palavras do Senhor a Jeremias no instante do seu chamado: “Assim veio a mim a palavra do Senhor, dizendo: Antes que eu te formasse no ventre, eu te conheci; e, antes que saísses da madre, te santifiquei e às nações te dei por profeta” (Jr 1.4,5).
Diante do texto supracitado, considere as seguintes verdades: I) Jeremias diz que “a palavra do Senhor” foi até ele, isto é, por meio da sua palavra, o próprio Deus foi lugar onde ele estava; II) Jeremias foi formado pelo próprio Deus no ventre da sua mãe; III) Jeremias foi conhecido por Deus antes mesmo de ter sido formado por Ele, e a expressão conhecer aqui denota relacionamento; IV) Deus diz que santificou — o mesmo que consagrou ou, ainda, separou — a Jeremias antes mesmo que ele nascesse, garantindo, assim, a exclusividade; V) Por fim, Deus diz que presenteou às nações com Jeremias para que lhes servisse como profeta.
Fica mais do que claro que, antes de entregá-lo para atuar como profeta, Deus priorizou uma relação pessoal com Jeremias, utilizando-se de termos bem íntimos e pessoais, como evidência de que mais importante que o trabalho do profeta é a vida do profeta. Do mesmo modo, antes de utilizar-se do líder como ferramenta nas suas mãos, o Senhor da Igreja opta por valorizar e trabalhar a pessoa do líder nas mais variadas áreas da sua constituição como pessoa, começando pela sua personalidade, passando pelos cuidados pessoais que o líder deve ter e nutrindo meios pelos quais os seus relacionamentos sejam saudáveis e possam beneficiar a sua vida e o seu trabalho.
I – O LÍDER COMO PESSOA
Há uma forte tendência, tanto do líder como dos seus liderados, em perder de vista o fato de que, por mais bem-sucedido que o líder possa ser, ele é uma pessoa e, além de ter de ser visto assim, ele deve ser tratado dessa forma. A personalidade do líder deve ser levada em conta e valorizada, assim como a sua integralidade e a sua necessidade de bons, saudáveis e duradouros relacionamentos.
A Personalidade do Líder
De acordo com o Novíssimo Dicionário da Língua Portuguesa, personalidade é a “qualidade do que é pessoal; caráter próprio de uma pessoa; aquilo que a distingue de outra”.2 Em uma ampliação do conceito, a personalidade tem sido definida como o conjunto de fatores afetivo, emocional e habitual, que, juntos, formam o ser de uma pessoa. Além disso, a personalidade também indica a consciência que a pessoa tem de si mesma e a forma como ela lida com o ambiente onde vive.
Pensar a personalidade do líder é, portanto, considerar a sua individualidade, levando em conta o seu bem-estar físico, emocional e espiritual, haja vista que, em certo nível, o exercício e o sucesso da sua liderança dependem de que esses aspectos estejam bem ajustados e equilibrados.
Partindo do princípio de que uma das principais funções de um líder é a de influenciar os seus liderados, é imprescindível para o líder cristão a manutenção da coerência entre o que ele ensina e a forma como vive a sua vida pessoal. O exemplo do líder passa pelo seu aspecto ético, mas não pode estar limitado apenas a isso, porém deve envolver a sua estrutura física, a sua constituição emocional e a sua base espiritual.
Evidentemente que o cuidado com a saúde física, emocional e espiritual é indispensável ao líder cristão, só que esse cuidado não se dá pelo cuidado em si, mas deve ser moldado e cultivado pelos padrões bíblicos; afinal de contas, trata-se de uma liderança cristã e que, acima de qualquer outro objetivo, tem como meta a glória de Deus e a condução da igreja no seu alvo de cumprir a sua missão na terra. O cuidado integral do líder cristão deve, portanto, ser pautado pelas Escrituras.
A Humanidade do Líder
Refletir sobre a constituição integral do líder depende do destaque de que o homem foi criado por Deus, mas não somente isso, sendo indispensável que se considere como isso se deu e qual o propósito da sua existência.
A expressão “Assim foi criado o homem” feita por Armínio resulta numa questão central: “Assim como?” E essa questão pode ser respondida sob dois aspectos: I) O processo — leia-se o método — pelo qual Deus criou o homem; II) A constituição do homem, isto é, a sua estrutura. Nota-se, portanto, que o homem distingue-se dos demais seres criados por Deus, e isso se dá por diferentes razões, dentre as quais se destaca a sua dupla constituição, isto é, a sua estrutura material e imaterial (Gn 2.7). Na sua Teologia Sistemática, o teólogo Norman Geisler afirma que “a natureza dos seres humanos inclui a sua dignidade” e, com base no texto de Salmos 8.5, ele destaca que “a humanidade é uma criação especial de Deus”.4
Quanto à criação do homem e à sua constituição, a Bíblia apresenta Deus como o idealizador e o criador do homem (Gn 1.27; 2.7; 5.1,2; 6.7; Dt 4.32; 43.1,7; 45.12; Rm 9.20; 1 Co 15.45; Cl 3.10; 1 Tm 2.13; Tg 3.9). A Escritura coloca o homem como uma criação especial; afinal, o homem foi criado (do hebraico barra — criar algo novo), formado (do hebraico asah — preparado) e moldado (do hebraico yatzar — modelar).
A Bíblia também afirma que Deus criou o homem à sua imagem e semelhança (ver Gn 1.27), e isso tem sido tema de muita discussão, e, dentre as diferentes formas de interpretar essa verdade, encontra-se a que defende que a imagem e a semelhança de Deus podem ser notadas no trino ser do homem: corpo, alma e espírito. Aqui está a forma como Deus constituiu o homem ao criá-lo.
Definitivamente, o homem é um ser tricotômico, isto é, a sua estrutura é constituída de corpo, alma e espírito (Ec 12.7; Mt 6.25; 10.28; 1 Co 5.3,5; 1 Ts 5.23; Hb 4.12). Uma vez que o corpo foi criado por Deus, que o espírito pertence a Deus e que a alma é dada por Ele, não se pode pensar que um sobreponha ao outro em termos de importância, pois se cada uma dessas partes advém do Criador, todas elas têm a mesma importância e o mesmo valor.
O líder deve ser resoluto no sentido de buscar o equilíbrio entre as partes da sua constituição humana sem nunca desconsiderar a sua integralidade. Indubitavelmente, o apóstolo João tinha isso em mente quando expressou o seu desejo de que Gaio tivesse saúde física, emocional e espiritual (3 Jo 2).
O líder bem-sucedido é aquele que, dentre outras coisas, valoriza cada área da sua constituição humana, pois reconhece que foi Deus quem o criou dessa forma, razão pela qual ele deve buscar a tão desejada e necessária disciplina com vistas ao cuidado com a sua vida, em nível integral, e não parcial. Considere-se também que um líder saudável em todas as áreas da sua vida tem maior condições de cumprir a sua missão com mais empenho, dedicação e eficácia.
O Líder e os seus Relacionamentos
Conforme já visto, o cuidado do líder cristão deve compreender cada área da sua estrutura humana, mas, afinal de contas, como isso pode ser feito efetivamente?
Há muitos meios pelos quais o líder cristão não somente pode, como também deve cuidar da sua vida pessoal, emocional e espiritual; entretanto, relacionamento é uma palavra que contribui no sentido de restringir essa reflexão para responder a essa questão. Isso mesmo! O líder cristão que almeja alcançar êxito na sua trajetória pessoal e ministerial deve ser alguém que valoriza, busca e cuida dos seus relacionamentos em cada uma das áreas da sua vida.
O que se propõe aqui é uma reflexão em torno da necessidade que o líder tem de relacionar-se bem com Deus, consigo mesmo e com o próximo, pois, fazendo assim, toda a sua estrutura humana estará coberta por relacionamentos que contribuirão significativamente com a sua saúde física, emocional e espiritual, o que resultará, naturalmente, em frutos duráveis da sua liderança.
O pecado cometido por Adão e Eva afetou negativamente o relacionamento do homem nos seus três níveis: I) Com Deus, pois, assim que pecaram e perceberam a presença de Deus no jardim, procuraram uma forma de esconderem-se do Senhor (Gn 3.8); II) Consigo, já que o texto bíblico informa que, assim que pecaram, ambos estavam nus (3.7); e III) Com o próximo, mesmo porque, quando questionado sobre o seu erro, Adão atribuiu a culpa à Eva, como clara demonstração de egoísmo e falta de compaixão com o seu cônjuge (3.12).
O Senhor Jesus veio para desfazer não somente os efeitos, como também as próprias obras do Diabo (1 Jo 3.8). A redenção operada por Jesus é capaz de resolver o problema do homem com Deus (2 Co 5.19; Cl 2.14-17), consigo (Rm 8.1-21) e com o próximo (Ef 5.21-33). Com base nisso e ciente de que o líder cristão tem a responsabilidade de ensinar, guiar e influenciar os seus liderados a viver e a experimentar as bênçãos que Cristo conquistou na cruz, a restauração dos relacionamentos nas suas três dimensões deve ser parte das ações de uma liderança cristã comprometida com o Senhor da Igreja.
É evidente que uma das condições para que o líder tenha êxito nessa tarefa é por meio do exemplo, e, nesse caso, à medida que ele mantém um bom relacionamento com Deus, consigo e com os seus semelhantes, os seus liderados serão influenciados e motivados a também viver nesse mesmo nível, ou, ao menos, ter esse padrão como ideal a ser alcançado. A promoção e a manutenção de relacionamentos saudáveis, portanto, devem ser uma das prioridades na agenda de um líder cristão.
CUIDADOS QUE UM LÍDER DEVE TER
Ainda numa abordagem sobre a pessoa do líder, este capítulo possui um caráter exortativo no sentido de alertar sobre alguns dos muitos cuidados que o líder cristão deve ter no exercício da sua liderança, começando pelo cuidado que o líder deve ter em conhecer e atuar dentro do seu próprio limite, passando pela necessidade e o incentivo de o líder manter-se em constante processo de aperfeiçoamento por meio do preparo inerente ao seu trabalho e finalizando com a advertência sobre os perigos de expectativas desalinhadas aos padrões bíblicos.
Cuidado em Conhecer o seu Próprio Limite
Não é surpresa para ninguém o fato de que todo líder deseja ter êxito na sua liderança. Mas, afinal de contas, qual o critério para que um líder cristão seja considerado bem-sucedido?
Números são importantes e têm, sim, o seu lugar no processo de análise sobre a performance de um determinado líder; influência — nas suas mais variadas formas –— também tem o seu lugar e possui um caráter estratégico em busca dos objetivos preestabelecidos de uma liderança; do mesmo modo, a capacidade intelectual de um líder também desempenha um importante papel na conduta dos projetos a ser elaborados, executados e avaliados. Entretanto, dentro de uma perspectiva estritamente bíblica, a principal “régua” para medir o sucesso de uma liderança é a fidelidade, e quem estabelece essa verdade é o apóstolo Paulo, ao escrever: “Além disso, requer-se nos despenseiros que cada um se ache fiel” (1 Co 4.2).
Mas, o que caracteriza a fidelidade de um líder cristão?
Por fidelidade deve-se entender a qualidade de um líder fiel, que, por sua vez, tem como características a confiabilidade nos seus relacionamentos e nos seus negócios. Em uma análise ainda mais ampliada, o líder fiel é alguém que cumpre o que diz, que cumpre com as suas obrigações, sendo, por isso, digno de confiança.
Sendo assim, de maneira objetiva, o líder cristão fiel pode ser definido como aquele que pauta o exercício da sua liderança no padrão ensinado por Jesus, quer seja por palavras, quer seja por exemplos práticos.
Conforme será visto mais à frente, o Senhor Jesus é o maior líder que já passou por esta terra, e as suas qualidades são inúmeras em quantidade e admiráveis em qualidade. Aqui, porém, o destaque repousa sobre a sua humildade, pois essa virtude é um dos seus argumentos ao convidar os seus discípulos a aprenderem dEle (Mt 11.29). Fundamentado nisso, destaca-se que a humildade é uma qualidade necessária a todo líder cristão que deseja ser contado entre os que são chamados de fiéis. Mas, afinal, o que é ser um líder humilde?
Em linhas gerais, o líder cristão marcado pela humildade é aquele cujas ações demonstram dependência em Deus em detrimento de si mesmo, assim como é capaz de valorizar as outras pessoas.7 Como se vê, a humildade manifesta-se, portanto, de diferentes formas e em diferentes dimensões, quer dizer, tanto na que é conhecida somente por Deus como naquela que os homens têm conhecimento; a humildade dá os seus frutos nas esferas visível e invisível, interna e externa. Do mesmo modo, é preciso que o líder cristão busque em Deus um coração humilde para que as suas ações sejam capazes de refletir essa realidade.
Um líder que se parece com Jesus em demonstração de humildade é alguém que tem conhecimento de si mesmo e do seu limite de atuação. Com essa preocupação, o apóstolo Paulo advertiu Timóteo a que — mesmo diante do sofrimento, rejeição e oposição — cumprisse o seu chamado de evangelista (2 Tm 4.5).
A humildade, portanto, propicia ao líder cristão as seguintes bênçãos: I) Conhecimento e clareza quanto ao seu lugar e à sua atuação dentro do que Deus está realizando no mundo; II) Motivação e condições para enfrentar os desafios inerentes à liderança cristã; III) Manter-se firme sem perder de vista qual é a sua missão efetivamente; capacidade de respeitar e honrar com naturalidade a atuação de outras pessoas nas suas devidas funções, mantendo, assim, relacionamentos bons, saudáveis e duradouros.
Como evidência de um coração humilde, o líder cristão de sucesso atua nos seus próprios limites e honra as atuações e o valor do trabalho dos seus irmãos.
Cuidado em Preparar-se
Ninguém vai além do preparo que têm. Essa é uma máxima que deve fazer parte das convicções de um líder cristão que deseja ser bem-sucedido no seu ministério. Lembrando que sucesso, aqui, está relacionado com fidelidade, e não com expectativas simplesmente humanas. Diante disso e considerando a integralidade da pessoa do líder, essa seção dedica-se em refletir sobre o compromisso do líder com o seu preparo em três aspectos principais: I) Espiritual; II) Intelectual; III) Pessoal.
O preparo de um líder cristão deve ser dinâmico, permanente e interminável. Há muitos textos bíblicos que confirmam a necessidade de o líder buscar crescer e aperfeiçoar-se constantemente, porém poucos retratam isso tão bem quanto as seguintes palavras de Paulo: “[…] não julgo que o haja alcançado; mas uma coisa faço, e é que, esquecendo-me das coisas que atrás ficam e avançando para as que estão diante de mim, prossigo para o alvo […]” (Fp 3.13,14).
A saúde da vida espiritual de um líder cristão é imprescindível para a sua liderança, e a sua manutenção depende de práticas como oração, meditação bíblica, consagração, conversas sagradas que contribuam com o crescimento espiritual; afinal de contas, é isso o que se espera de cristãos maduros (1 Co 14.26). Essas práticas espirituais certamente permitirão que o líder tenha a sensibilidade necessária e a firmeza esperada para o bom uso dos dons espirituais enquanto exerce a sua liderança (1 Pe 4.10). O preparo intelectual também tem o seu lugar de destaque na galeria dos cuidados que um líder precisa ter, e isso é visto na admoestação que o apóstolo Paulo fez a Timóteo, ao escrever: “Persiste em ler, exortar e ensinar […]” (1 Tm 4.13). Por fim, o preparo pessoal do líder também é parte de um todo a ser considerado como prioritário no cuidado consigo, conforme Paulo advertiu os líderes da igreja que estava em Éfeso: “Olhai, pois, por vós […]” (At 20.28) e a Timóteo: “Tem cuidado de ti mesmo […]” (1 Tm 4.16).
É evidente que os cuidados nos níveis apresentados aqui representam um grande desafio a todo líder, e isso só poderá acontecer mediante uma vida disciplinada. Essa disciplina é chamada por Bill Hibells de “autoliderança” e é explicada por ele nas seguintes palavras que pertencem a parte de uma experiência pessoal dele.
Conclui-se, portanto, que a disciplina pessoal de um líder cristão proporcionará a ele condições para que a sua liderança seja próspera e duradoura.
Cuidado com as Expectativas Erradas
As expectativas erradas representam um perigo a qualquer pessoa, mui especialmente aos líderes cristãos, pois a frustração pode conduzi-los a situações inimaginavelmente desagradáveis e até prejudiciais. Por esse motivo, a Bíblia Sagrada adverte sobre isso de diferentes formas, quer seja por meio de fatos históricos, quer seja pela apresentação da expectativa genuinamente bíblica.
Samuel pensou que, ao pedir um rei, o povo estivesse rejeitando a ele, mas o Senhor disse-lhe: “[…] pois não te tem rejeitado a ti; antes, a mim me tem rejeitado, para eu não reinar sobre ele” (1 Sm 8.7). Uma expectativa errada pode levar um líder a frustrar-se e a decepcionar-se.
Atente para as palavras de Paulo a Timóteo: “Por este motivo, te lembro que despertes o dom de Deus, que existe em ti […]” (2 Tm 1.6). Diante da rejeição e da oposição de alguns e do desafio de ter de visitar a Paulo na prisão em Roma, Timóteo foi admoestado a despertar o dom que havia nele; observe, porém, que o apóstolo utiliza a expressão “Por este motivo”. Qual seria “este” motivo? A resposta está nos versículos anteriores, em que há principalmente as informações da trajetória de fé e ministerial de Timóteo, o que, para Paulo, eram tudo o que o jovem obreiro necessitava para cumprir o seu ministério. O líder cristão corre um sério risco quando perde de vista o que realmente precisa para exercer a sua liderança.
Mas, afinal, qual deve ser a expectativa do líder cristão?
No que se refere à ação de Deus, o líder deve confiar que todo crescimento procede do Senhor (1 Co 3.6); já no que concerne à ação do homem diante de Deus, a expectativa deve ser de agradar a Deus por meio da sua fidelidade (1 Co 4.1-2).
A VIDA ESPIRITUAL E FAMILIAR DO LÍDER
Para finalizar esta parte cujo objetivo tem sido enfatizar alguns dos cuidados que devem estar presentes na trajetória de um líder, a ênfase recai sobre dois aspectos que servem como selo para os demais, pois tanto a vida espiritual como a estrutura familiar para o exercício da liderança de alguém não é só fundamental, como também vital. Esta seção é dividida da seguinte forma: I) A espiritualidade de um líder cristão; II) A relação entre o líder e a sua família; III) Práticas espirituais no exercício da liderança cristã.
A Espiritualidade de um Líder Cristão
Como definir a espiritualidade de um líder cristão?
Em primeiro lugar, destaca-se o que se entende aqui por espiritualidade.
A espiritualidade cristã está fundamentada na experiência pessoal e real do cristão com o seu Senhor, experiência esta que influencia a forma como se crê e o seu relacionamento com Deus, a maneira de pensar a existência humana, a forma como as pessoas relacionam-se consigo e com o mundo exterior. Dito de outra forma, a espiritualidade cristã é a vida espiritual na prática, referindo-se às evidências dos fundamentos e princípios cristãos. Percebe-se que a espiritualidade cristã lida com a complexa relação entre o invisível e o visível, o sobrenatural e o natural ou, ainda, o divino e o humano.
A espiritualidade de um líder cristão é, portanto, um tema a ser levado em alta consideração, pois diz respeito à sua relação com Deus, com o meio onde vive e com as pessoas com as quais convive, e, por meio de uma espiritualidade bíblica e saudável, essa liderança agradará a Deus e o favorecimento aos liderados como prioridades na sua prática, o que certamente refletirá o perfil de uma liderança verdadeiramente aprovada pelo Senhor.
O Líder e a sua Família
Liderar no âmbito cristão é só mais uma forma de servir a Deus e agradá-lo. Nesse caso, o líder cristão é desafiado a sentir e a agir sob os mesmos princípios da vida cristã, com o diferencial de que isso é feito enquanto exerce a sua liderança. Uma das formas mais eficazes para verificar-se a maturidade de um cristão e a sua vida espiritual é por meio da engrenagem da sua relação familiar.
Paulo ensinou a igreja que estava em Éfeso sobre a necessidade de uma vida cheia do Espírito Santo e indicou que o fruto disso é a bondade, a justiça e a verdade (Ef 5.9,18). Em seguida, o apóstolo passou a mostrar como deve ser a vida familiar de um cristão como clara demonstração dessa vida sob o domínio do Espírito Santo com as seguintes características: I) A esposa que vive em sujeição ao seu marido (5.22); II) O marido que ama a sua esposa (5.25); III) Filhos que obedecem aos seus pais (6.1-3); IV) Pais que não provocam a ira dos seus filhos (6.4). Em linhas gerais, uma vida cristã madura sob o domínio do Espírito de Deus resultará em demonstrações práticas dentro de uma engrenagem familiar bem ajustada e que glorifica ao Senhor.
Como cristão, o líder que atua no contexto da Igreja de Cristo também é responsabilizado por trabalhar pela manutenção de uma família saudável com vistas a glorificar a Deus e servir de exemplo aos seus liderados. Ao orientar Timóteo sobre o perfil daqueles que deveriam ser separados para trabalhar no contexto da igreja como líderes, Paulo esteve focado — praticamente o tempo todo — no aspecto do relacionamento, principalmente no que se refere à família (1 Tm 3.1-13), e não foi — e nem poderia ser — diferente do que falou a Tito (1.5). Cuidar da sua vida familiar é, portanto, dever elementar de um líder cristão de sucesso.
Práticas Espirituais de um Líder
A última abordagem deste capítulo diz respeito às práticas espirituais para uma liderança cristã exitosa, e, assim como para os demais cuidados, elas exigem disciplina para que sejam atendidas. David Kornfield apresenta uma série de práticas espirituais separadas em duas classes, chamadas por ele de “disciplinas de abstinência e disciplinas de engajamento”. As práticas das disciplinas de abstinência são: I) Solitude; II) Silêncio; III) Jejum; IV) Frugalidade; V) Castidade, pureza; VI) Segredo, sigilo; VII) Sacrifício. Já as práticas das disciplinas de engajamento são: I) Estudo; II) Adoração; III) Celebração; IV) Serviço, oração; V) Comunhão; VI) Confissão; VII) Submissão.10
Fica, portanto, um alerta: líder cristão, cuide-se!
Que Deus abençoe a sua aula e os seus alunos!
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