Lição 6 – Fé para crer que na natureza humana e divina de Jesus
Prezado(a) professor(a), para ajudá-lo(a) na sua reflexão, e na preparação do seu plano de aula, leia o subsídio da semana. O conteúdo é de autoria do pastor Eduardo Leandro Alves, comentarista do trimestre.
INTRODUÇÃO
Quem olhar para Cristo a partir da perspectiva do Novo Testamento estará dentro de um quadro de referencial teocêntrico. Quanto mais a teologia aprofunda-se no significado de Jesus como o Cristo de Deus, mais próxima torna-se de compreender o Deus de Cristo. Jesus caracterizava-se por apontar não para si mesmo, mas para o seu Pai, que o enviara. Nenhuma doutrina pode ser chamada de cristã se não contém uma conexão significativa com a revelação definitiva de Deus na pessoa de Jesus, o Cristo. A centralidade de Cristo não está limitada a uma parte específica da teologia, pois Cristo é central tanto na ordem da criação quanto no âmbito da redenção da criação, afetada pelo pecado. Mesmo o nosso conhecimento de Deus é, em última análise, nas palavras de Braaten,1 determinado pela maneira como Deus é revelado na pessoa de Jesus. Independentemente do que possa ser sabido sobre Deus à parte da revelação em Cristo, a fé cristã vê no testemunho apostólico de Jesus, o Cristo, o critério final da verdade acerca da natureza e identidade de Deus. A doutrina da encarnação foi o pilar da cristologia ortodoxa desde o Concílio de Calcedônia até a era do Iluminismo, quando foi violentamente atacado pela crítica moderna. Nesse período, advogou-se a ideia de que a compreensão do Filho preexistente de Deus, que se torna um ser humano no ventre de uma virgem e, então, retorna para o seu lar celestial, está vinculada a uma imagem mitológica de mundo que conflitaria com a cosmovisão científica moderna. O objetivo deste capítulo é reafirmar as bases da divindade e singularidade de Jesus.
O Problema do Método
Quando se trata dos Evangelhos, que são a fonte que temos das informações sobre Jesus, o método histórico-crítico propõe uma leitura do evangelho que busca ver o texto sagrado como se fosse um texto comum e submete-o a uma análise racional, quanto ao seu conteúdo, e literária, quanto à sua composição (no capítulo 7, sobre profecias, tratamos um pouco sobre alguns proponentes de hermenêuticas pós-modernas — que vão além do método histórico-crítico — que dão ao autor autoridade de definir o significado do texto). Como resultado, para os adeptos clássicos do método histórico-crítico, os Evangelhos não são biografias históricas, mas, sim, testemunhos da fé, fruto de uma meditação piedosa e subjetiva da comunidade inicial do cristianismo. Assim, os Evangelhos são uma interpretação teológica dos eventos em vez de serem uma descrição objetiva e desinteressada do Jesus histórico de Nazaré. Para tais teólogos, os Evangelhos são o produto de um processo longo de reflexão sobre Jesus e o que Ele representa como dogma da Igreja Primitiva. Com isso, na visão deles, os Evangelhos possuem muito pouco do Jesus histórico, mas muita coisa em relação à fé que foi desenvolvida a partir das reações da própria fé dos seus seguidores. Buscam, então, a partir dos métodos da crítica histórica, peneirar o texto em busca do significado original. Obviamente, se o ponto de partida for de negação da inspiração, negação da autoridade do texto bíblico, chegaremos a qualquer conclusão, menos a que é a firmada no texto bíblico: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do Unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade” (Jo 1.14).
A Singularidade de Jesus
No caminho da compreensão da singularidade de Jesus Cristo, compreende-se que ele não somente era plenamente homem, mas também que era plenamente divino. Embora a palavra não ocorra explicitamente na Escritura, a igreja tem usado o termo encarnação para referir-se ao fato de que Jesus era Deus vindo em carne. Deus habitou entre nós. A encarnação foi o ato de Deus Filho pelo qual assumiu para si a natureza humana. A proposta deste texto, como método hermenêutico, é o histórico-gramatical, que propõe um caminho em que a prova escriturística da divindade de Cristo é bastante ampla no Novo Testamento. Vejamos tais provas sob diversas categorias. As Escrituras declaram a Divindade de Jesus. Um exemplo é a Palavra Deus (Theos) usada com relação a Cristo. Embora a palavra Theos, “Deus”, seja regularmente reservada no Novo Testamento para Deus Pai, há, no entanto, diversas passagens em que ela é usada também para referir-se a Jesus Cristo. Em todas essas passagens, a palavra “Deus” é usada em um sentido forte para referir-se àquEle que é criador do céu e da terra, o governante sobre todas as coisas. Essas passagens incluem João 1.1; 1.18; 20.28; Romanos 9.5; Tito 2.13; Hebreus 1.8 (citando Sl 45.6) e 2 Pedro 1.1. É suficiente observar que há, ao menos, sete passagens claras no Novo Testamento que se referem explicitamente a Jesus como Deus. Um exemplo do Antigo Testamento do nome Deus aplicado a Cristo é visto numa passagem messiânica que nos é muito familiar: “Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu; e o principado está sobre os seus ombros; e o seu nome será Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz” (Is 9.6). A palavra kyrios, Senhor, é aplicada a Cristo. Às vezes, a palavra Senhor (kyrios) é usada simplesmente como referência polida a um superior, que se aproxima de nosso tratamento respeitoso a uma pessoa mais velha ou em posição superior à nossa (Mt 13.27; 21.30; 27.63; Jo 4.11). Em outras ocasiões, essa palavra pode significar simplesmente o “senhor” de um servo ou escravo (Mt 6.24; 21.40). Todavia, a mesma palavra também é usada na Septuaginta (a tradução grega do Antigo Testamento, que era regularmente usada no tempo de Cristo) como uma tradução da palavra hebraica YHWH, Javé, ou “o SENHOR” (como é muitas vezes traduzida em muitas versões). A palavra kyrios é usada para traduzir o nome de Deus 6.814 vezes na versão grega do Antigo Testamento. Portanto, qualquer leitor de fala grega no tempo do Novo Testamento que possuísse algum conhecimento do Antigo Testamento em grego teria reconhecido que, nos contextos em que fosse apropriado, a palavra Senhor era o nome do criador e sustentador dos céus e da terra, o Deus Onipotente.
Evidência de que Jesus Possuía Atributos da Divindade
Onipotência, eternidade e onisciência são aplicadas à pessoa de Jesus. Jesus demonstrou a sua onipotência quando acalmou a tempestade no mar com apenas uma ordem (Mt 8.26,27), multiplicou pães e peixes (Mt 14.19) e transformou água em vinho (Jo 2.1-11). Jesus declarou a sua eternidade quando disse: “Eu lhes afirmo que antes de Abraão nascer, Eu Sou!” (Jo 8.58, NVI), ou quando disse: “Eu sou o Alfa e o Ômega” (Ap 22.13). A onisciência é demonstrada como atributo divino em Jesus pelo conhecimento do pensamento das pessoas (Mc 2.8) e por saber “desde o princípio quais deles não criam e quem o iria trair” (Jo 6.64, NVI). O texto bíblico demonstra que o conhecimento de Jesus era muito mais amplo do que a revelação de informação que as pessoas poderiam receber por meio do ofício profético, porque Ele mesmo conhecia a crença e a descrença que estava no coração de todas as pessoas (Jo 2.25; 16.30). O atributo da onipresença divina de Jesus não é afirmado diretamente durante o seu ministério terreno. Contudo, enquanto olhava para o tempo em que a Igreja seria estabelecida, Jesus pôde dizer: “Pois onde se reunirem dois ou três em meu nome, ali eu estou no meio deles” (Mt 18.20, NVI). Além disso, antes de deixar este mundo, Ele disse aos seus discípulos: “E eu estarei sempre com vocês, até o fim dos tempos” (Mt 28.20, NVI). A soberania divina, espécie de autoridade possuída somente por Deus, é vista no fato de que Ele podia perdoar pecados (Mc 2.5-7). Diferentemente dos profetas do Antigo Testamento que declararam “Assim diz o Senhor”, Ele pôde iniciar as suas afirmações com a expressão “Mas eu lhes digo” (Mt 5.22,28,32,34,39,44) — alegação espantosa da sua autoridade. Ele pôde falar com autoridade do próprio Deus porque Ele era plenamente Deus. Outra afirmação clara da divindade de Cristo é o fato de Ele ser digno de adoração, algo que não pertence a nenhuma criatura, incluindo anjos (Ap 19.10), mas somente a Deus. Todavia, a Escritura diz de Cristo que “Deus o exaltou à mais alta posição e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para a glória de Deus Pai” (Fp 2.9-11, NVI). Semelhantemente, Deus ordena aos anjos que adorem a Cristo, pois lemos: “E ainda, quando Deus introduz o Primogênito no mundo, diz: ‘Todos os anjos de Deus o adorem”’ (Hb 1.6, NVI).
Jesus Renunciou a alguns dos seus Atributos Divinos enquanto Viveu neste Mundo?
O que diz a teoria da kenosis? Paulo escreve aos filipenses: “Seja a atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus, que, embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se; mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens” (Fp 2.5-7, NVI). Começando por esse texto, diversos teólogos do século XIX advogaram uma ideia inesperada da encarnação chamada “teoria da kenosis”, que sustenta que Cristo abriu mão de alguns dos seus atributos divinos enquanto esteve neste mundo como homem. (A palavra kenosis é emprestada do verbo grego kenoō, que geralmente significa “esvaziar” e é traduzido por “esvaziou-se” em Fp 2.7.) Segundo essa teoria, Cristo “esvaziou-se” de alguns dos seus atributos divinos como onisciência, onipresença e onipotência enquanto esteve sobre a terra como homem. Isso foi visto como a autolimitação voluntária da parte de Cristo, que Ele assumiu a fim de realizar a obra de redenção. Mas o que realmente diz Filipenses 2.7,8? Após um exame mais preciso, podemos ver que Filipenses 2.7 não diz que Cristo “esvaziou-se de alguns poderes” ou que “esvaziou-se de atributos divinos” ou coisa parecida; antes, o texto descreve o que Jesus fez nesse “esvaziamento”. Ele não se esvaziou por abrir mão de qualquer dos seus atributos, mas por vir “a ser servo”, isto é, por passar a viver como homem e a ser “encontrado em
forma humana, humilhou-se a si mesmo e foi obediente até a morte, morte de cruz!” (Fp 2.8, NVI). Assim, o contexto interpreta o “esvaziamento” como equivalente a “humilhou-se a si mesmo”, assumindo uma posição ou condição mais baixa. O esvaziamento inclui o papel e a posição, não os atributos essenciais ou a natureza. Isso significa que Ele assumiu uma condição humilde, porém permaneceu divino. Qual o entendimento correto? A “teoria da kenosis”, portanto, não é o entendimento correto de Filipenses 2.5-7. De fato, se a teoria da kenosis fosse verdadeira (e essa é a objeção fundamental contra ela), então não mais poderíamos afirmar que Jesus tenha sido plenamente Deus enquanto esteve aqui neste mundo. A teoria da kenosis definitivamente nega a plena divindade de Jesus Cristo e faz dEle alguém menos que plenamente Deus.
Os Reformadores estavam corretos na sua compreensão de Jesus e a relação com o Pai. A História da Igreja demonstra que a crença na singularidade de Jesus é basilar para todo o desenrolar da fé. Para que a proposta do pluralismo religioso tenha “sucesso”, a singularidade de Jesus terá de ser questionada. Renunciar a tais compreensões acerca de Cristo é abrir mão do evangelho. É óbvio que a fé em Cristo não pode e não deve ser imposta, mas é fruto da ação da graça de Deus, que, por meio do Espírito Santo, leva o ser humano ao arrependimento e a uma resposta positiva ao convite da salvação.
CONCLUSÃO
O princípio da singularidade de Jesus, da sua divindade, visa responder à pergunta: “Que Deus?”. Há deuses em profusão na história das religiões. A luz do princípio cristocêntrico, nossa resposta é que esse Deus não é uma unidade simples, solitária, autossuficiente; esse seria o deus do deísmo e unitarismo clássico. Por outro lado, o Deus do cristianismo (da ortodoxia) é a realidade autoestruturante da fé trinitária, aquEle Um que, de modo antecedente, diferencia a divindade como Pai, Filho e Espírito Santo e é revelado como tal na história da salvação, onde as funções tornam-se claras. Diferentemente do deus da mitologia grega, ou de concepções sobre uma “divindade” impessoal, como energia, força, ou mesmo um conceito filosófico, o Deus da Bíblia, o Deus de Israel, não é um Deus apático, uma essência anônima ou infinitamente afastada da dor e do sofrimento da criação. O Pai sofreu junto com o Filho. Em si, essa ideia traz consigo o conceito da singularidade de Jesus. O Pai de Jesus Cristo também sofreu em todo o processo, não como um resultado de alguma carência no seu ser, mas “a partir da abundância de amor”. Foi somente por meio da ação de Deus e da singularidade de Jesus que a singular declaração pôde ser feita pelo apóstolo João: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16). Jesus Cristo é singular e incomparável!
Professor(a), para conhecer mais a respeito dos temas das lições, adquira o livro do trimestre: ALVES, Eduardo Leandro. A Prova da Vossa Fé: Vencendo a Incredulidade para Uma vida Bem-Sucedida. Rio de Janeiro: CPAD, 2023.