Lição 5 – Como ler as Escrituras
ESBOÇO DA LIÇÃO
INTRODUÇÃO
I – A BÍBLIA PRECISA SER INTERPRETADA
II – PRESSUPOSTOS PENTECOSTAIS PARA LER A BÍBLIA
III – REGRAS BÁSICAS DE INTERPRETAÇÃO
CONCLUSÃO
Esta lição apresenta três objetivos para os professores atingirem em suas aulas:
1. Expor que a Bíblia precisa ser interpretada;
2. Pontuar os pressupostos pentecostais para a leitura da Bíblia;
3. Apresentar os princípios básicos de interpretação.
Ler e interpretar a Bíblia de maneira adequada é um grande desafio. Em nosso país há culturalmente o déficit de leitura. Infelizmente, os membros das igrejas evangélicas não passam incólume por essa realidade cultura. Embora que, na igreja local, há muitos leitores da Bíblia que acabam fazendo um movimento contrário de não leitura.
O desafio é grande e precisamos conscientizar os leitores da Bíblia que é necessário uma interpretação sadia das Sagradas Escrituras. A ausência dessa consciência tem gerado interpretações esdrúxulas, heresias e desvios que fazem mal a Igreja de Cristo.
Para interpretar as Sagradas Escrituras, precisamos consciente a respeito da importância da exegese, da limitação dos leitores e da natureza da Bíblia. Sobre isso, veja como o trecho do livro do Trimestre aprofunda essa matéria:
1. A Importância da Exegese
O termo “exegese” vem do grego “ex”, traduzido como “fora”, e “agein”, com o sentido de “guiar”. Literalmente, significa “guiar para fora”, isto é, extrair a intenção das palavras de um texto. Quando se fala de exegese bíblica, entende-se o termo como explicação e interpretação de um ou mais textos bíblicos. O exegeta reformado Uwe Wegner defende que “a exegese quer ajudar a compreender os textos bíblicos, apesar da distância de tempo e espaço e das diferenças culturais”.1 Os teólogos pentecostais concordam com essa assertiva, e acrescentam que o alvo da exegese é deixar que as Escrituras digam o que o Espírito Santo pretendia no seu contexto original.2 Para sustentar o alicerce da interpretação, usa-se a hermenêutica como metodologia da exegese bíblica. A palavra “hermenêutica” origina-se do verbo grego “hermeneuein”, cujo significado é igual ao da exegese, ou seja, “interpretar”. Contudo, deve-se deixar clara a diferenciação entre um termo e outro. A hermenêutica bíblica designa os princípios que regem a interpretação dos textos; a exegese descreve as etapas ou os passos que cabe dar em sua interpretação.3 Em síntese, a hermenêutica apresenta as regras e a exegese é a prática dessas regras.
Diante dessas conceituações e com o propósito de evitar as falácias, interpretação superficial ou equivocada da Bíblia, a hermenêutica e a exegese apresentam ferramentas que auxiliam na correta interpretação e aplicação dos textos sagrados. Nesse objetivo, para não fazer o texto significar aquilo que Deus não pretendeu, é necessário um minucioso exame das Escrituras (2 Tm 2.15). Por exemplo, o estudo das línguas bíblicas, dos fatos da história, das questões sociopolíticas, das particularidades da cultura e dos recursos literários usados no texto sagrado coopera para a compreensão do real significado das palavras inspiradas (Ef 3.10-18). Portanto, a exegese não deve e não pode ser menosprezada durante a leitura e o estudo da Bíblia.
2. As Limitações dos Leitores
Nesse aspecto é preciso reconhecer que toda a vez que lemos a Bíblia estamos interpretando. Isso porque todos os leitores são também intérpretes (Dn 9.2). O problema dessa constatação reside nas ideias que trazemos conosco antes mesmo de começarmos a leitura da Bíblia (Ef 4.22). O erudito D. A. Carson adverte que “é fácil demais aplicarmos ao texto bíblico as interpretações tradicionais que recebemos de terceiros. Então, podemos involuntariamente transferir a autoridade das Escrituras para as nossas interpretações tradicionais”.4 Em vista disso, nem sempre o “entendimento” daquilo que lemos reproduz a verdadeira “intenção” do Espírito Santo (2 Pe 3.16). Acerca dessa realidade, Walter Henrichsen anota que “nas questões de religião o cristão se submete, consciente ou inconscientemente, a uma das seguintes autoridades, acatando-a como autoridade última: a tradição, a razão, ou as Escrituras”.5 Nossa avaliação é que a tradição não é totalmente um erro, uma vez que muitas práticas da Igreja são essencialmente bíblicas, porém, o que se deve combater é “a elevação da tradição a um status igual ou até mesmo superior das Escrituras”.6 Cristo advertiu que se tornar prisioneiro da tradição invalida a Palavra de Deus (Mc 7.13).
Quanto ao uso exclusivo da razão na interpretação bíblica, tal prática constitui-se em verdadeira tragédia para a fé. Liberalismo, cientismo e modernismo são os termos comumente utilizados para descrever esse tipo de conduta. Nossa teologia pentecostal afirma que defensores dessas teorias causam inevitáveis consequências ao Evangelho, tais como: “incredulidade, leniência para com o pecado; relativismo moral e ético; relaxo para com a evangelização, etc.”.7 Desse modo, contrapondo a posição que coloca a autoridade final de interpretação na “tradição” ou na “razão”, o pentecostalismo se apresenta como ortodoxo e coloca a Escritura “no lugar em que ela tem de estar como a nossa suprema e inquestionável árbitra em matéria de fé e prática. Se a Escritura diz, é a nossa obrigação ser-lhe obediente sem quaisquer questionamentos”.8
Com essa percepção, reafirma-se que a Bíblia é o supremo tribunal de recursos, isto é, a Escritura é a autoridade última em questões de fé, normas, conduta, percepção e visão de mundo para o autêntico cristão. No entanto, em virtude de nossa inclinação pecaminosa que nos induz ao erro (Rm 8.7), precisamos usar métodos sadios que nos auxiliem na interpretação das Escrituras (Rm 12.2). O teólogo D. A. Carson insiste que “estamos lidando com os pensamentos de Deus; somos obrigados a nos esforçar o máximo para entendê-los verdadeiramente e explicá-los com clareza”.9 Essa é uma nobre tarefa atribuída a todo salvo em Cristo Jesus (1 Tm 4.13; Ap 1.3).
3. A Natureza das Escrituras
Nesse ponto, ratificamos que a necessidade de a Bíblia ser interpretada acha-se na natureza da própria Palavra de Deus. Como já estudado, o texto bíblico foi escrito majoritariamente em duas línguas distintas (hebraico e grego), no período aproximado de 1600 anos, por cerca de 40 autores que viveram em épocas e culturas diferentes. Portanto, os textos canônicos possuem particularidades que não podem ser ignoradas. Dentre tantas, podemos citar as narrativas, as poesias, as crônicas, as profecias e as parábolas que precisam ser interpretadas, sob a orientação do Espírito Santo, observando as regras gramaticais e o contexto histórico e literário de quando foram redigidas (Mt 5.18).
Em virtude dessas características, no período dos Pais da Igreja,10 o desenvolvimento dos princípios da hermenêutica e da exegese deu- -se basicamente em três grandes centros: (a) A Escola de Alexandria, que era dotada de um espírito conciliatório e tentava harmonizar a doutrina cristã com a filosofia da época por meio de uma abordagem alegórica; (b) A Escola de Antioquia, que era caracterizada pela abordagem literal das Escrituras, na busca pelo sentido primário pretendido pelo autor; e (c) A Escola Ocidental, que ficou marcada pelo acréscimo de outro elemento, a saber, a autoridade da tradição e da Igreja na interpretação da Bíblia.11
Essa última escola adentrou a Idade Média, e, nessa época, a interpretação bíblica ficou refém da tradição e dos concílios da Igreja. Quanto a essa deplorável situação, Hugo de São Vitor (1096-1141 d.C.) escreveu o seguinte: “aprende-se primeiro o que deves crer e então vai à Bíblia para encontrar confirmação”.12 Nesse contexto, na Alemanha foi deflagrada a Reforma Protestante (1517 d.C.). E, com a influência da Renascença, se passou a dar atenção ao conhecimento das línguas originais a fim de entender a Bíblia. A compreensão histórico-gramatical começou a ser valorizada. Os dois grandes expoentes são Martinho Lutero e João Calvino. É de Calvino a célebre frase: “O intérprete deve permitir que o autor diga o que realmente diz, invés de lhe atribuir o que pensamos que devia dizer”.13
NOTAS
1 WEGNER, Uwe. Exegese do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1998, p. 12.
2 A concordância com o exegeta referenciado é meramente conceitual. Discordamos da forma de aplicação do método histórico-crítico defendido por ele, quando este ressignifica ou relativiza o texto bíblico.
3 WEGNER, 1998, p. 12.
4 CARSON, D. A. A Exegese e suas falácias: perigos na interpretação da Bíblia. São Paulo: Vida Nova, 1999, p. 15.
5 HENRICHSEN, Walter A. Princípios de interpretação da Bíblia. São Paulo: Mundo Cristão, 1997, p. 10.
6 COMFORT, Philip Wesley. A origem da Bíblia. Rio de Janeiro: CPAD, 1998, p. 68.
7 SILVA, Antonio Gilberto da (Ed.). Teologia sistemática pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2013, p. 24.
8 SILVA (Ed.), 2013, p. 24.
9 CARSON, 1999, p. 15.
10 Esse termo adquiriu sentido mais técnico desde o quarto século, especialmente no contexto das controvérsias teológicas que povoaram o quarto e o quinto séculos da era cristã. Os que viveram próximo do colegiado apostólico de Cristo são chamados de Pais Apostólicos. E os que viveram depois são divididos em pais ante-nicenos e pós-nicenos em referência ao Concílio de Niceia realizado em 325 d.C.
11 OLIVEIRA, Raimundo Ferreira de. Princípios de hermenêutica. Campinas, EETAD, 2001 p. 7,8.
12 BERKHOF, L. Princípios de interpretação bíblica. Rio de Janeiro: JUERP, 1981, p. 26.
13 BERKHOF, 1981, p. 30.
Texto extraído da obra:
BAPTISTA, Douglas. A Supremacia das Escrituras: A Inspirada, Inerrante e Infalível Palavra de Deus. 1.ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2021, pp.49,53.